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O planejamento do setor elétrico é indelegável


Qualquer sistema elétrico é um universo complexo. No Brasil é mais complexo ainda. Temos um sistema interligado com mais de 84 milhões de unidades consumidoras, quase 200 GW de potência instalada, com consumo médio de 80 GW e mais de 160 mil km de linhas de transmissão, atualmente com mais de 25% da potência instalada de geração através de fontes intermitentes. Manter a segurança de entrega de energia aos consumidores é um trabalho gigantesco realizado pelo ONS (Operador Nacional do Sistema).

Entretanto, esta estabilidade pode estar ameaçada. É quase a crônica de um problema anunciado. Temos de um lado o crescimento vertiginoso de fontes intermitentes e, por outro, a baixa expansão de geração de base - hídricas e térmicas- capaz de suportar os entreves causados, e não são poucos, por essa intermitência. Mesmo não sendo adequadamente remunerados pelos serviços ancilares, a geração hidrelétrica vem cumprindo seu papel. Porém, reconheçamos que não há expansão em geração hidráulica no curto prazo e as térmicas contratadas por regime de capacidade somente entrarão em operação daqui a quatro ou cinco anos. Até lá teremos mais 20 GW de intermitência entrando no sistema. Se houver uma estiagem média neste período, salve-se quem puder. Como o poder concedente não manifesta publicamente esse risco, imagino que esteja sob controle. Mas fica a pergunta: há risco real? Manter o planejamento da expansão de forma não determinativa é deixar o planejamento para o mercado e, tal como vem sendo até hoje, teremos geração longe da carga, linhas de transmissão caras e longas, subestações idem, sem que se pratique a orientação que o setor requer: expansão pelo menor custo global.

Essa regra está absolutamente esquecida, em desfavor do consumidor. Leilões regionais e por fonte são absolutamente necessários. O Mercado Livre também precisa conhecer que não basta comprar R$/MWh, onde quer que ele seja gerado, pois não se trata apenas de diferenças de submercados, mas do custo de transporte da energia, do armazenamento e dos serviços ancilares. Afinal, quem gerar o ônus tem que pagar a conta.

Por que não estimular até o limite dos seus potenciais a geração hidrelétrica brasileira? São mais econômicos, 100% nacional, menor emissão de gases efeito estufa na cadeia produtiva, não intermitente, mantém áreas de preservação ambiental em seus reservatórios que são de usos múltiplos, geram benefícios socioambientais incomparáveis com outras formas de geração de energia elétrica. Será que existe uma miopia científica nesta avaliação ou as forças de mercado superam as obviedades não reconhecidas?

Outro tema a ser considerado é o descasamento do setor elétrico com o mercado de gás natural. Esse é um ponto de interrogação difícil de explicar. As térmicas contratadas por capacidade e zero de inflexibilidade (zero de despacho e que ficam à disposição do ONS) precisam apresentar contratos de suprimento de gás natural e como não sabem quando vão despachar ficam pagando take-or-pay para o supridor. Isso é dinheiro rasgado. Posto fora. Não seria melhor despachar nos limites dos take-or-pay para o sistema receber essa energia? Aí vem a pergunta complementar: se a resposta à pergunta anterior for sim, o que fazer com a energia não controlável das intermitentes? É uma conta de oferta e demanda pelo menor custo global a ser gerenciada pelo poder concedente, distribuindo os custos para quem os gera. Simples assim.

A integral da geração distribuída remota não é infinita. O setor elétrico é como um jogo de xadrez de múltiplas, jogado baseado nas reações do outro jogador, o consumidor. Planejar adequadamente é garantir a segurança energética com custos adequados. Não bastam 85% de geração renovável e abundante e energia cara ao consumidor final. O poder concedente, lato sensu (energia e meio ambiente) não pode renunciar ao planejamento, que é intransferível e deve voltar os olhos ao grande potencial hidroenergético que o Brasil possui, mantendo aqui o que é daqui.






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